Luiz Henrique Lima
O pessimismo é um luxo dos ricos. A frase é de Mia Couto, em célebre Aula Magna numa universidade moçambicana e consta de sua coletânea de ensaios “E se Obama fosse africano?”. Para esse genial escritor, quem necessita se dedicar ao trabalho e aos estudos para alcançar melhores condições de vida para si e para os seus não tem tempo para elucubrações negativistas. O pessimismo seria, assim, resultante, do ócio improdutivo, luxo que só os muito ricos podem se conceder.
Em perspectiva semelhante, o filósofo Mário Sérgio Cortella afirma que “o pessimista, na verdade, é um vagabundo. É muito fácil ver uma situação difícil e dizer que não vai dar certo. Difícil é se mexer para mudar isso”.
Tanto a felicidade como o otimismo podem parecer manifestações ingênuas, ou até resultantes de desinformação e ignorância, para aqueles que diuturnamente se embriagam do noticiário sobre guerras, violência, epidemias, tragédias naturais ou humanas, escândalos políticos e financeiros etc. Para os pessimistas, as coisas estão sempre piorando, o país e o mundo caminham aceleradamente para o desastre, os problemas são cada vez maiores e insolúveis e não se pode confiar em ninguém para impulsionar o progresso. Para eles, todos os líderes políticos, empresariais, sociais, religiosos e culturais são sempre suspeitos, hipócritas, incompetentes ou coisa pior.
Como eu, o leitor provavelmente convive com pessoas assim, que se comprazem no negativismo e são incansáveis apologistas do fracasso, sempre atribuído a outrem. Procuro ter paciência, pois sou um convicto otimista, com os pés no chão.
Pois bem, esta semana tive acesso a um livro extraordinário, sobre o qual já ouvira falar muito bem. Seu nome é Factfulness e ainda não há previsão de sua tradução para o português. Seu principal autor é o médico e estatístico sueco Hans Rosling, falecido recentemente, com a colaboração de Ola Rosling e Anna Rosling Rönnlund.
Rosling foi um notável pesquisador e cientista, que trabalhou alguns anos na África e desenvolveu uma excepcional capacidade de comunicação com o público leigo, como se pode observar nas suas diversas palestrar disponíveis gratuitamente na internet em plataformas como TED e YouTube, na sua maioria com legendas em português. De forma bem-humorada e utilizando com maestria recursos de animação gráfica, Rosling torna compreensíveis milhares de dados estatísticos relativos à evolução econômica e social de mais de uma centena de países ao longo de um século. E, de forma tranquila, nos conduz a conclusões inesperadas.
Factfulness, de certa forma, é a versão escrita desse conjunto de palestras, com maior profundidade e riqueza de informações, mas sem abandonar uma linguagem leve e direta. A obra tem como subtítulo “Dez razões pelas quais estamos errados em nossa visão do mundo e porque as coisas são bem melhores do que você pensa”.
Em cada capítulo, os autores nos mostram os vieses que afetam nosso raciocínio, influenciando negativamente nossa compreensão sobre o mundo e levando a distorções na tomada de decisões sobre políticas públicas e até mesmo na esfera individual e microeconômica. De modo convincente, apresentam os extraordinários progressos que a humanidade tem alcançado em inúmeras áreas como a redução da mortalidade infantil e do analfabetismo, a produção econômica e o respeito aos direitos das mulheres, entre muitos outros.
Bill Gates declarou que Factfulness é um dos livros mais importantes que já leu e sou obrigado a concordar. Espero que a obra em breve seja publicada no Brasil para que, na próxima vez que um pessimista profissional se aproximar com a sua cantilena, você possa oferecer-lhe uma leitura edificante e com rigor científico. Quem sabe o surpreendente humor do professor sueco possa vencer a preguiça intelectual?
Luiz Henrique Lima
Conselheiro Substituto e atual Vice Presidente do TCE-MT
Graduado em Ciências Econômicas, Especialização em Finanças Corporativas, Mestrado e Doutorado em Planejamento Ambiental, Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia.